quarta-feira, fevereiro 22, 2006

VOU-ME EMBORA PARA PASÁRGADA

Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada

Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconsequente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que nunca tive

E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei um burro brabo
Subirei no pau-de-sebo
Tomarei banhos de mar!
E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d’água
Pra me contar as histórias
Que no tempo de seu menino
Rosa vinha me contar
Vou-me embora pra Pasárgada

Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcalóide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar

E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
Lá sou amigo do rei
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada

Manuel Bandeira

segunda-feira, fevereiro 20, 2006

UNS POEMAS DE AGOSTINHO

A quem faz pão ou poema
só se muda o jeito à mão
e não o tema.

Atingira um silêncio tão de espanto
que era todo universo à sua volta
um seduzido canto.

E posto que viver me é excelente
cada vez gosto mais de menos gente.

Não sei quem manda na vida
mas a quem for eu me entrego
e o que queira me decida.

Pé firme leve dança
que o saber seja adulto
mas o brincar de criança.

Agostinho da Silva

quarta-feira, fevereiro 15, 2006

VIAGEM

Aparelhei o barco da ilusão
e reforcei a fé de marinheiro.
Era longe o meu sonho, e traiçoeiro
o mar...
(Só nos é concedida
esta vida
que temos;
E é nela que é preciso
procurar
o velho paraíso
que perdemos).
Prestes, larguei a vela
e disse adeus ao cais, à paz tolhida.
Desmedida,
a revôlta imensidão
transforma dia a dia a embarcação
numa errante e alada sepultura...
Mas corto as ondas sem desanimar.
Em qualquer aventura,
o que importa é partir, não é chegar.


António Gedeão

sexta-feira, fevereiro 10, 2006

REDONDILHAS

a esta cantiga alheia

Perdigão perdeu a pena,
não há mal que lhe não venha:

VOLTAS

Perdigão, que o pensamento
subiu em alto lugar,
perde a pena do voar,
ganha a pena do tormento.
Não tem no ar nem no vento
asas, com que se sustenha:
não há mal que lhe não venha.

Quis voar üa alta torre
mas achou-se desasado;
e, vendo-se depenado,
de puro penado morre.
Se a queixumes se socorre,
lança no fogo mais lenha:
não há mal que lhe não venha.

Luís Vaz de Camões

quarta-feira, fevereiro 08, 2006

A AMA ELECTRÓNICA

As crianças e os jovens de hoje têm as chaves das suas casas e passam grande parte do tempo sozinhos, recorrendo automaticamente à televisão. É ela a única companhia que tem durante longas horas, exercendo a função de “ama electrónica” como lhe chamou o Papa João Paulo II.

Popper, o grande pensador há pouco tempo desaparecido, constatando o avolumar da importância dos meios de comunicação e o seu reflexo nos comportamentos das crianças e dos jovens, chegou a dizer que se fosse necessário se empregasse a censura.

Eu não preconizo a censura propriamente dita – sofremo-la durante quase meio século – mas proponho que se faça uma reflexão séria sobre estes problemas e se encontre a forma de criar um enquadramento ético, se estabeleçam regras firmes que balizem os programas.

Que se oiçam os representantes dos pais, dos professores e dos próprios jovens e que se exija o cumprimento do que as leis e regras estabelecidas exigem. Isto para bem das gerações futuras.


Sensatas palavras de Maria Barroso (excerto de um artigo publicado no Diário Económico) perante as consequências perniciosas que certas mensagens da televisão podem ocasionar nas nossas crianças e jovens pondo em risco a sua formação, deseducando-as e deformando-as.

sábado, fevereiro 04, 2006

E NÓS SENHOR?

O novo executivo da Câmara de Águeda, liderado por Gil Nadais, no dia em que completou três meses de exercício, parte dos quais ocupados a “desamarrar” alguns nós que impediam o concelho de se desenvolver”, anunciou, em conferência de imprensa, várias medidas que pretendem implementar no futuro próximo.

E nós Senhor?
Porque nos dais tanta dor?
Porque padecemos assim?

sexta-feira, fevereiro 03, 2006

AS CARICATURAS DE MAOMÉ

Em Setembro do ano passado, o jornal dinamarquês Jyllands-Posten publicou uma série de “charges” caricaturando Maomé e, essas ilustrações foram, posteriormente, republicadas na Noruega, França e Alemanha.

A divulgação destas caricaturas de Maomé está a causar uma considerável polémica internacional devido às reacções dos muçulmanos, em cuja religião qualquer representação pictográfica de Maomé é considerada uma blasfémia.

A polémica alastra e as suas consequências são, de momento, imprevisíveis. Ficam para o debate algumas questões fundamentais:

- Qual a importância da liberdade de imprensa na nossa sociedade?
- Será que a liberdade da imprensa significa que nada está livre de ser satirizado?
- A publicação de textos ou imagens que firam a consciência religiosa de um grupo de pessoas é compatível com a liberdade de imprensa?
- Até que ponto é que a liberdade de imprensa deve ser “respeitosa”?
- Ter respeito por outras culturas e religiões significa incorporar os seus dogmas?
- O que é que prejudica mais a religião muçulmana e as suas comunidades religiosas. As caricaturas ou a reacção dos seus crentes a essas caricaturas?
- Quais são os limites da nossa liberdade?

Sem querer defender a posição de qualquer fanático ou intolerante religioso dos muitos que, infelizmente, por aí campeiam e sob pena de ser considerado conservador ou até reaccionário, sempre direi que há coisas com que não devemos brincar. Há muitos ódios e recalcamentos que mais vale deixar sossegados.

A nossa liberdade não tem, apenas, como limite a liberdade dos outros.
A nossa liberdade tem, também, limites que o bom senso nos deve impor.