domingo, março 11, 2007

Aveiro terra de cidadania?

Depois de, no passado dia 28 do passado mês de Fevereiro, ter levado ao conhecimento do Exmo. Sr. Procurador da República do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, a situação do vogal da Assembleia Municipal de Aveiro Sr. Diogo Soares Machado que, como é público e notório, em Dezembro de 2005, foi contratado pela empresa “Aveiro Expo – Parque de Exposições E. M.” para o lugar de Director de Marketing e Projectos, lugar que vem a exercer cumulativamente com o de vogal da Assembleia Municipal de Aveiro, solicitando a interposição da competente acção para perda de mandato, fiquei, pacientemente, a aguardar que o processo seguisse o seu curso normal.

Porém, no dia 5 de Março, fui surpreendido por um comunicado da CPC de Aveiro do CDS/PP no qual o Sr. Dr. Miguel Capão Filipe, fazendo uso de considerandos pouco sérios, invectiva a minha conduta, procurando, ao mesmo tempo, acintosamente, deslustrar a actuação de membros do actual governo, particularmente do Sr. Governador Civil Dr. Filipe Neto Brandão que, no mínimo, lhe deveria merecer o respeito e a consideração que merece a todos os aveirenses que conhecem a lhaneza da sua actuação e o seu carácter impoluto.

Assim, embora esteja convencido que todos já se aperceberam de que lado está a razão, nesta matéria, não podemos deixar de tecer alguns comentários ao referido comunicado que repudiamos e cremos ter sido escrito, pelo Sr. Dr. Capão Filipe, numa má hora. E certos que todos nós passamos por maus momentos, não obstante a forma e os termos empregues no seu comunicado, não pretendemos fechar os caminhos de cidadania e da ética que devem presidir às relações pessoais e institucionais entre dois membros de partidos diferentes, mantendo-nos abertos a uma ideia de sociedade em que não sejamos condenados a sermos lobos uns dos outros, mas a sermos, não apenas cidadãos, mas concidadãos que procuram as melhores soluções para os seus problemas comuns.

Ao lermos o referido comunicado ficámos desde logo admirados pelo facto do Sr. Dr. Capão Filipe, que se arroga herdeiro da “linha da tradição humanista e democrática” que “marca o glorioso passado do seu partido”, nada dizer quanto à razão fundamental subjacente à questão em causa. De facto, a verdadeira questão, o escopo do problema, reside na necessidade de acautelar o princípio ético fundamental da imparcialidade das decisões da Assembleia Municipal, que ficariam inexoravelmente viciadas se situações, como a que está em análise, não fossem corrigidas.

Assim, ficámos profundamente admirados, e até chocados, por o responsável político local do CDS/PP pretender remeter para a estrita análise legal o principio básico de, no desempenho de cargos públicos, ninguém poder ser juiz em causa própria, de ninguém poder simultaneamente desempenhar uma função e fiscalizar os actos que pratica no desempenho dessa função, de ninguém poder ser nomeado para funções em cargos municipais ou de empresas maioritariamente detidas pela autarquia e continuar, como membro da Assembleia Municipal, a fazer o seu acompanhamento e fiscalização.

É necessário que os portugueses, especialmente os que ocupam cargos políticos ou públicos, permitam, através do seu exemplo, fazer desaparecer os “espertos” que enxameiam a nossa sociedade e fazem apodrecer o nosso carácter colectivo. Os “espertos” que violam a lei para, a coberto da impunidade reinante ou da morosidade da justiça, daí retirarem proveito. Os “espertos” que estudam ao pormenor e se aproveitam das lacunas ou das imperfeições da lei para, “legalmente”, dela “sacarem” todos os possíveis benefícios.

Por isso, a ética é uma questão que, nos dias de hoje, tem de ser atentamente considerada e aplicada pois, só com ética, podemos vencer a preocupante crise de autoconfiança que atravessa a nossa sociedade. Mas temos de ter em atenção que
a ética, não é uma questão de estética. A ética é, essencialmente, uma questão de carácter. Que nem todos possuem!

Mas se à questão ética o Sr. Dr. Capão Filipe nada disse, o que, na ânsia de arranjar uma escapatória legal justificativa da injustificável actuação do seu correligionário e amigo pessoal Sr. Diogo Machado disse, relativamente às questões legais, disse mal e pior do que isso,
utilizou argumentos falsos e falaciosos para advogar a sua posição.

Pretendendo defender a ideia que existem dois pareceres contraditórios à mesma questão, começa a construir a sua falaciosa trama, afirmando que Sr. Diogo Machado solicitou um parecer “acerca da existência de uma eventual incompatibilidade ou inelegibilidade, atenta a sua situação jurídico-laboral na empresa municipal denominada Aveiro Expo – Parque de Exposições E. M. e a sua qualidade de vogal da Assembleia Municipal de Aveiro, à luz do regime legal recentemente alterado”.

Ora o que o Sr. Diogo Machado requereu e foi superiormente transmitido pela Sra. Presidente da Assembleia Municipal foi um pedido de parecer “referente à sua eventual incompatibilidade produzida com a publicação da Lei nº 53-F/2006 de 29 de Dezembro”. A questão da inelegibilidade não é questionada e, se o fosse, não seria, certamente, nos termos da Lei nº 53-F/2006. Este acrescento da questão da inelegibilidade é, astuciosamente, colocado no comunicado assinado pelo Sr. Dr. Capão Filipe para mistificar a questão e levar ao engano os leitores. Faltou à verdade e isso fica-lhe mal Sr. Dr. E daqui o exorto a publicar na íntegra o texto que, através do meio informático (vulgo email), da empresa municipal em que trabalha, o Sr. Diogo Machado enviou à Exma. Sra. Presidente da Assembleia Municipal, para todos aferirmos se em qualquer parte do texto, cujo essencial acima reproduzimos, se fala em inelegibilidade.

Qualquer jurista, mesmo medíocre, lhe teria dito que a referida Lei, mormente no seu art. 47º, apenas contempla o estatuto do gestor local e as suas incompatibilidades. Coisa que o Sr. Diogo Machado (ainda) não é. E se não aplica ao caso é óbvio que a conclusão será que, nos termos dessa Lei, não existe qualquer tipo de incompatibilidade entre as funções que o referido Sr. exerce na Aveiro Expo e o cargo que cumulativamente exerce na Assembleia Municipal.

O que existe no caso do Sr. Diogo Machado é uma inelegibilidade superveniente que, nos termos da Lei, produz perda de mandato. Simplificando a terminologia, para que todos possamos perceber, a Lei impede que pessoas que ocupam determinados cargos ou funções possam ser eleitas para os órgãos das autarquias locais, onde exercem funções ou jurisdição. E, se após a eleição se colocarem em situação que os torne inelegíveis, ou seja se porventura passarem a ocupar esses cargos ou a desempenhar essas funções, perdem o mandato. Ou seja: se o Sr. Diogo Machado fosse, à altura da apresentação das listas, director da Aveiro Expo não poderia ter sido candidato à Assembleia Municipal. Como posteriormente foi contratado para a função que actualmente ocupa, perde o direito ao mandato para que foi eleito.

Daí a questão que coloquei ao Sr. Governador Civil de Aveiro, que nos termos do art. 291º da Constituição da República Portuguesa representa o Governo e exerce os poderes de tutela na área do nosso distrito, ter sido a seguinte:

“O membro da Assembleia Municipal que posteriormente à sua eleição e subsequente tomada de posse venha a ser contratado para exercer funções de Director (Director de Marketing e Projectos) numa Empresa Municipal (Aveiro - Expo, Parque de Exposições, E. M.) cujo capital social é maioritariamente detido pelo mesmo Município onde exerce as suas funções de autarca (Município de Aveiro), coloca-se na situação de inelegibilidade prevista na alínea d) do nº 1 do art. 7º da Lei Orgânica nº 1/2001 de 14 de Agosto e, como tal, na situação de perda de mandato prevista na alínea b) do nº 1 do art. 8º da Lei 27/96 de 1 de Agosto?”

Clarinho como a água. Mas como facilmente se verifica estamos perante questões profundamente diferentes, donde os pareceres obtidos serem, naturalmente, diferentes.

Outro assunto que importa esclarecer, dadas as ilações que ignorante ou malevolamente se pretenderam extrair do facto, consiste na razão de os pareceres serem remetidos e emitidos por organismos diferentes. Tal facto deve-se ao estrito cumprimento da legislação em vigor (Despacho nº 6695/2000 de 8 de Março) que no seu nº 2 prescreve que “Os pareceres solicitados pelos membros do Governo”… (v.g. o Governador Civil) “são emitidos pela DGAL”. Já o nº 3 do mesmo despacho prescreve que “Os pedidos de parecer jurídico das autarquias locais (v.g. a Assembleia Municipal)
sobre matérias de incidência autárquica devem ser endereçadas às DRAA das CCR, através de ofício assinado pelo presidente do órgão autárquico respectivo ou seu substituto legal”…

Dir-me-á o Sr. Dr. não conhecia esta legislação em vigor. Nem pelos vistos a Sra. Presidente da Assembleia Municipal de Aveiro, embora seja jurista. Mas como sabe, a ignorância da Lei não aproveita ao infractor.

No referido comunicado pretende-se ainda confundir as pessoas afirmando que parecer da CCRDC afirma “a inexistência de qualquer incompatibilidade ou inelegibilidade decorrente das funções laborais exercidas” pelo Sr. Diogo Machado. Mais uma forma habilidosa de “ler” um parecer que, o que realmente diz após defender a inexistência de incompatibilidade nos termos da Lei nº 53-F/2006, é o seguinte:

“Poderá, sim existir uma inelegibilidade superveniente, se efectivamente as funções exercidas pelo membro dessa Assembleia Municipal, na empresa em questão, se subsumirem em funções de direcção, ou seja, se o Dr. Diogo Machado tiver a responsabilidade de superintender, coordenar ou chefiar actividade de um ou mais sectores da empresa, na directa dependência dos órgãos da administração” sendo certo que no ponto 7º do seu parecer afirma que “O Exmo. membro da Assembleia Municipal de Aveiro, Dr. Diogo Machado, é titular de um contrato de trabalho a termo resolutivo, pelo período de 36 meses, o qual teve início em 16 de Dezembro de 2005. Nesse mesmo contrato, foi designado como Director de Projectos e Marketing, cabendo-lhe nomeadamente, as funções de direcção do respectivo serviço, bem como tarefas de coordenação de Projectos de Marketing, Prospecção de Mercados, Direcção Comercial, Gestão de Recursos Humanos, análise de Projectos de Investimento, assessoria e preparação técnica das reuniões do Conselho de Administração, coordenação e gestão de eventos e supervisão económica e financeira”.

Isto é, mesmo não tendo sido solicitada a dar parecer sobre esta matéria, a jurista alerta para a possível existência de uma inelegibilidade superveniente. E se algumas dúvidas poderiam subsistir relativamente a esta questão, dado o vínculo da relação, o parecer subscrito pela Sra. Directora-Geral da Direcção-Geral das Autarquias Locais reconhece peremptoriamente a existência dessa inelegibilidade afirmando:

“o membro da Assembleia Municipal de Aveiro, que após a eleição, seja contratado para exercer funções de direcção como Director de Marketing, na "Aveiro-Expo, Parque de Exposições, E.M." (empresa municipal cujo capital é maioritariamente detido pelo Município de Aveiro) incorre em perda de mandato, em virtude de se colocar em situação de inelegibilidade especial prevista no artigo 7º, nº 1, alínea d), da Lei Orgânica nº 1/2001 (cfr. artigo 8º, nº 1, alínea b) da Lei 27/96, de 1 de Agosto - Regime jurídico da tutela administrativa)”.

Este parecer é perfeitamente claro e não deixa qualquer margem para dúvidas relativamente à natureza do vínculo uma vez que, no seu ponto 8, afirma:

“… face à ratio legis da inelegibilidade especial determinada na Lei Orgânica nº 1/2001, entre as quais salientamos razões de isenção e de imparcialidade que se visam acautelar, assim como o efeito útil da norma, estão sujeitos a inelegibilidade especial aqueles que exercem cargos de direcção nos entes constituídos por autarquias locais ou em que estas detenham posição maioritária, dos círculos eleitorais onde exercem funções ou jurisdição, independentemente da natureza e tipo de vínculo que suporta a relação jurídica em causa”.

Por isso Sr. Dr. Capão Filipe exorto-o a alterar o seu comportamento e a mudar de atitude porque parece-me que se continuar por estes caminhos do desrespeito às mais elementares regras éticas e a habilidosamente tentar retorcer a lei e os factos em seu favor ou dos seus amigos e correligionários políticos, tentando justificar o injustificável, os seus eleitores vão ficar muito (mais) decepcionados consigo. Siga, pelo menos, o exemplo da Sra. Presidente da Assembleia Municipal que, embora com mais de um ano de atraso de que ainda não ouvi fazer “mea culpa”, tomou a correcta decisão de impedir que o Sr. Diogo Machado ocupasse, como queria, o seu lugar na bancada do CDS/PP evitando males maiores. E, em vez de gastar o seu tempo a escrever estes comunicados que só o deixam ficar mal, comece a pensar numa estratégia para evitar as funestas consequências da presença ilegítima de um influente membro do seu Partido na Assembleia Municipal de Aveiro, que não poderia ter participado e influenciado importantes decisões da Assembleia, em que o seu voto e a sua presença foram determinantes para o actual executivo municipal ter aprovado as suas propostas.

E, já agora, para finalizar. O Sr. Dr. Capão Filipe não julgue que me apouca ao tratar-me de cidadão. De facto sinto-me muito honrado por me classificar como tal. De me classificar como foram classificados os "sans culottes", patriotas sem haveres materiais mas plenos de honra que, influenciados pelos mais elevados ideais, aboliram a servidão e os direitos feudais da nobreza, essa parasitária camada palaciana e cortesã que sobrevivia à custa do Estado, tomaram a Bastilha e proclamaram os
inextinguíveis princípios universais da "Liberdade, Igualdade e Fraternidade".

Cidadão que não abdica dos seus direitos de cidadania, que lhe dão o direito de ter uma participação, directa e activa, na vida política, condição e instrumento fundamental de consolidação do sistema democrático, que tanto custou a erigir aos portugueses (embora não a todos).

5 Comments:

At segunda-feira, março 12, 2007 12:08:00 AM, Blogger Terra e Sal said...

Finalmente vejo a resposta ao Lorde do Senhor Vereador Capão Filipe...
É certo que, o Dr. Capão Filipe, é apenas um “mexilhão” neste mar revolto e confuso que é a Coligação de onde não se sabe ao certo de onde partem as directrizes, e onde acaba a solidariedade entre eles...

Gostei da maneira como falou de Homens de Honra, e da Ética...
Deu exemplos bem caros a todos nós daqueles que, abdicando das suas mordomias lutaram por um mundo mais justo e fraterno.
Felizmente podemos dizer que entre nós, na nossa cidade, tivemos Homens que foram exemplos dessa riqueza moral, que alguns coitados agora, desprovidos de qualquer deontologia, humildade e inteligência, tentam apagar das nossas memórias.

Mas há Homens e homens, como sempre houve o trigo e o joio...
Sabemos que o Dr. Capão Filipe através do seu comunicado, esteve mal, muito mal mesmo, foi como sempre, infeliz...

Assim como o sacudir a água do capote feitas na altura com insinuações, pelo senhor Diogo Machado e senhor Manuel Coimbra, ao quererem atingir Órgãos de Soberania, revelaram com isso, um carácter muito pouco escrupuloso...
Resumindo eu diria:
Estão todos bem, uns para os outros...

Como é possível quererem fazer acreditar que a Lei que nos rege a todos por igual, pode ser alterada, a qualquer momento, por hipotéticas conveniências do partido “A” ou “B”?

Efectivamente a Coligação é pobre porque não tem ponta de juízo, mas quis estabelecer-se...
E sempre ouvi dizer que:
Quem não é competente não se estabelece!

Fico a aguardar qual é o entendimento do Senhor Procurador da Republica sobre este assunto tão melindroso em que aparentemente um Vogal participou ilegal e abusivamente nas decisões da Assembleia Municipal...
Do mesmo modo penso que, todas as sessões em que ele participou, devem ser anuladas...
A democracia é, e tem de continuar a ser, transparente como a água.

Gostei da sua resposta, mas eu não batia tanto no lorde...
Mas ele também já está habituado a ser “malhadinho” pelos “sócios da Coligação”, isso é verdade, por isso, é mais cacetada, menos cacetada...

Cumprimentos.

 
At segunda-feira, março 12, 2007 1:53:00 AM, Anonymous Anônimo said...

Dr. Raul Martins

Como cidadão agradeço o esclarecimento.

Se relativamente às questões éticas que evoca não tinha dúvidas fico agora mais elucidado sobre a argumentação legal que suportou a sua intervenção.
Fico também mais descansado por saber que o nosso Estado de Direito consagra e defende princípios éticos que me parecem fundamentais.

Entristece-me ver líderes políticos locais, com elevadas responsabilidades na nossa comunidade, não perceberem a importância acrescida de na sua actividade pública defenderem comportamentos modelares.

Associadas a esta situação emergem, a meu ver, outras questões: Porque entendeu o Sr. Presidente da Câmara Municipal de Aveiro não dever pronunciar-se sobre esta situação? Não considera ter responsabilidades neste processo? Revê-se no comunicado do CDS/PP? Considera esta uma questão apenas legal? Devem os cidadãos aveirenses assumir o seu silêncio como indicação dos princípios que irão reger a sua actuação?
Talvez os próximos capítulos nos esclareçam.

 
At segunda-feira, março 12, 2007 4:02:00 PM, Anonymous Anônimo said...

Dr.Raul Martins,e não cobra nada de dar explicações a quem devia saber o que faz e o que diz.
Enexplicavelmente ninguém sabe o que esta Camara pretende, agravada com vereadores que nada fazem e só aplicam a mentira.
E o Presidente da Camara de Aveiro, cúmplice, a vê-los passar.
Aveiro ficou mais pobre.
Já ninguem acredita.
Tanta incompetência, aguardamos o próximo episódio!...

 
At terça-feira, março 13, 2007 12:27:00 AM, Anonymous Anônimo said...

estamos perante o El(i)o Mais Fraco...pode sair!

 
At quinta-feira, março 15, 2007 4:21:00 PM, Anonymous Anônimo said...

Este executivo da Camara de Aveiro, nem para a Vagueira servia!

 

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